Eu não poderia começar a escrever esse texto sem antes dizer que minha história somente pode ser escrita hoje porque muitas pessoas antes de mim batalharam para descobrir outras formas possíveis de viver. Dentre elas, destaco Rachel Carson, que lançou o livro “Primavera Silenciosa” em 1962 e provocou a proibição do DDT*, impulsionando mudanças em leis sobre água, terra e ar, um verdadeiro marco do movimento ambientalista no mundo. E somos todos frutos disso!
Na primavera de 2018 foi a minha vez. Abri a primeira loja zero waste do Brasil, em São Paulo, ao lado da minha sócia Lori Vagas e com o apoio de mais de 300 pessoas (e outras tantas nos bastidores) que disseram SIM a esse espaço. A Mapeei – Uma Vida sem Plástico busca promover os pequenos produtores sustentáveis que desejam produzir de forma não agressiva e trabalham um consumo verdadeiramente consciente, de ponta a ponta da cadeia.
É muito fácil nos perdermos no emaranhado de nossos objetivos, não é? Por isso, criar códigos e processos é tão importante. É preciso estruturar nossos caminhos abertos com tanto esforço, muitas vezes errando e outras tantas acertando, sem perder de vista um sonho: estamos promovendo revoluções, aprendendo sobre CUIDADO e sobre CONSISTÊNCIA.
Chegamos ao limite. Já despedaçamos os sistemas ecológicos que sustentam a vida em nosso planeta. A ciência tem nos avisado sobre isso há anos. Carson já nos avisava! Perturbamos tanto os sistemas com nossa antropologia torta guiada pelo lucro que a capacidade de regeneração dos mesmos chegou ao limite.
Todos os dias vivencio na loja a força das mulheres em suas práticas sustentáveis. Somos a maioria esmagadora nesse processo, tanto como produtoras quanto como apoiadoras de projetos revolucionários e sustentáveis. E isso no mundo todo! Talvez por temos em nosso código genético a carga de organização social como coletoras e cuidadoras. No dia a dia da loja e na idealização do projeto, cresço e aprendo tanto sobre e com as pessoas que estão ao redor! Elas desejam dias melhores, cuidam para que tudo aconteça com maestria. Em todo o nosso país, são milhares de produtores e pessoas que acreditam verdadeiramente em um mundo mais sustentável e seguem firmes nesse propósito, de um mundo mais justo com os seres humanos e a natureza.
Resolver desigualdades e acessos é um desafio imenso, vivencio isso todos os dias ao tentar ter na loja uma embalagem sem plástico que provém da Amazônia, por exemplo.
Crescer sem destruir, florescer em uma sociedade compartilhada e de espaços múltiplos é o que está por trás de todos os movimentos conectados com a sustentabilidade. Mas como crescer e ao mesmo tempo ser sustentável em um planeta finito? Acredito que a resposta seja justamente transitarmos de uma sociedade automática e impulsiva para uma sociedade autônoma e reflexiva. “Pensar antes de…”. Afinal, no consumo automático, escolher é poder. Desvendar e disseminar informações sobre toda a cadeia produtiva do que consumimos nos torna mais aptos a escolher melhor.
Saber que uma roupa foi costurada por uma criança da idade da minha filha me coloca em outro patamar de consumo do fast fashion. Mesmo que eu não possa pagar os preços do produto orgânico com tingimento natural, também não quero ser condizente com crianças em linha de produção. Nesse sentido, o jogo de pensar em alternativas fica cada vez mais interessante e desafiador quanto mais informações eu obtenho.
Por exemplo, se eu sei que no desodorante que eu costumo usar tem alumínio (e uma série de outros químicos nocivos) e isso prejudica a minha saúde e também o planeta, começo a direcionar minha escolha para alternativas mais naturais e até mesmo produzir meu próprio desodorante em casa.
Tudo isso tem norteado o meu trabalho há alguns anos. Precisamos saber do nosso impacto ambiental. Temos que pensar em nós? Claro, mas também pensar e agir por todos. E todos aqui é TODOS mesmo: seres humanos, espécies, planeta. Eu acredito que possamos reparar o que fizemos de torto até o momento. Muitas das consequências já são inevitáveis e teremos que trabalhar muito nesse processo de mudança. Cada um é importante! Cada um tem relevância em vir junto.
* o primeiro pesticida da Idade Moderna usado amplamente durante e depois da Segunda Guerra Mundial com objetivo de combater mosquitos da dengue e da malária.
Em 1º de Janeiro de 2015 nascia o Menos 1 Lixo, um desafio pessoal da Fe Cortez, de produzir menos lixo e provar que atitudes individuais somadas constroem um mundo mais sustentável.