7 de setembro é o dia que o Brasil abandonou a condição de colônia e se posicionou como independente. Não mais a colônia portuguesa, mas o Império do Brasil. Você já pensou sobre esse feriado?
Definir uma data como feriado nacional é reforçar o simbolismo que ela representa. É pararmos um momento da nossa rotina pra celebrarmos ou refletirmos sobre um acontecimento. E alguns deles são conectado à História do nosso país, como o 21 de abril, o 7 de setembro e o 15 de novembro. E todos carregam um ponto de vista bastante peculiar, de uma história contada pelos “vencedores”.
O Dia da Independência do Brasil é um feriado nacional desde o final da década de 1940 e é a celebração da nossa emancipação com Portugal. A celebração envolve voltarmos a 1822 e comemorarmos apenas um único fato: o fim da nossa colonização no papel. Nesse período, o Brasil ainda era governado por um português - filho do rei! - e estávamos mergulhados em um regime escravocrata, que teria seu fim oficial 66 anos depois.
O feriado é marcado com desfiles cívicos e patrióticos pelas ruas das capitais e pequenas cidades do Brasil, especialmente em Brasília. Forças Armadas, Força Aérea Brasileira, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Guarda Municipal são alguns dos coletivos que participam dos desfiles que têm o objetivo de reforçar nossa percepção de nação e de vibrar pela liberdade. Durante a ditadura militar, os desfiles eram obrigatórios para os estudantes.
Como um feriado que vibra pela independência do Brasil como colônia é possível, se existe um aumento de quase 50% do número de brasileiros que optam por morar em Portugal hoje? A independência é em relação ao que? Porque ainda seguimos os padrões eurocêntricos de sucesso, ignoramos (e eliminamos) a sabedoria dos que moravam aqui antes da invasão portuguesa e assistimos a um desfile militar como símbolo de liberdade.
Em 2000, quando fizemos 500 anos desde a invasão de Portugal por aqui - o que muita gente ainda chama de Descobrimento - índios xavantes e mehinakus entregaram uma carta em protesto ao então presidente Fernando Henrique Cardoso, afirmando não existir qualquer comemoração. E por que? Bom, em 1500, estima-se que a população indígena era de 3 milhões. Em 1650, 700 mil. Em 1957, quase 10 anos depois do dia 7 de setembro ser instituído como feriado nacional, eram 70 mil.
E o que eu queria sugerir como reflexão pro feriado em 2020 é: o modelo de extração-produção-consumo-descarte foi desenhado por um processo histórico que começou na Europa e que carrega a visão eurocêntrica de sucesso. E não digo isso pra demonizar europeus, longe disso. Digo isso pra refletirmos sobre as nossas raízes e o que poderíamos celebrar: a ancestralidade da nossa terra Brasil. Uma terra que era indígena até a invasão portuguesa. E que segue sendo indígena, ainda que continuemos com um projeto de genocídio em andamento. Se nos conectássemos com essas raízes, não estaríamos produzindo tanto lixo, descartando tantas coisas e vivendo com números alarmantes da quantidade de toxinas que estamos ingerindo pelos produtos de limpeza, pela comida, pelos cosméticos. Estaríamos conectamos à natureza, à lógica do reaproveitamento, ao não desperdício e ao amor pelo que a terra nos oferece.
E por que escolhemos celebrar o dia 7 de setembro e não uma data de celebração aos indígenas? Por que não estudamos as sabedorias ancestrais do resgate da nossa natureza? Por que não atrelamos a liberdade ao direito das populações indígenas à sua terra, sem assistirmos à expulsão de morte de tantas delas? Quais são as nossas independências?
Não refletir sobre tantos porquês, nos trazem à uma sociedade pandêmica, que destrói a biodiversidade, que se alimenta de agrotóxicos e que descarta mais de 10 milhões de toneladas de plástico por ano nos oceanos. Se tivéssemos honrado nossa ancestralidade indígena, não estaríamos assistindo ao fogo no Pantanal e na Amazônia. Não estaríamos ingerindo tantos remédios e ignorando a nossa responsabilidade no contexto global de degradação. E não estaríamos despejando 130 mil toneladas de mercúrio nos rios da Amazônia, impedindo que indígenas yanomami tomem banho ou bebam água.
Por isso, eu quero te convidar a pensar sobre tudo isso e mais um pouco. Porque nós precisamos problematizar nossas raízes, nossa História e as nossas narrativas. A regeneração tá dentro da gente e tá aqui nessa terra maravilhosa que carrega o nome de uma árvore que oferece um tingimento vermelho, que é a cor do coração :)
Somos coração. Topa mergulhar nessa reflexão?
Em 1º de Janeiro de 2015 nascia o Menos 1 Lixo, um desafio pessoal da Fe Cortez, de produzir menos lixo e provar que atitudes individuais somadas constroem um mundo mais sustentável.